Direito canábico ou Direito à cannabis – Regulamentação do uso da cannabis para fins medicinais, acesso a planta e evolução do mercado

Adentrando ao universo do Direito Canábico, este artigo visa desmistificar e explicar, em termos simples, a área jurídica relacionada à cannabis. Com a crescente discussão sobre a legalização, entender os aspectos legais e os direitos associados ao uso dessa planta é essencial. Vamos explorar juntos as nuances do Direito Canábico e como ele se aplica na sociedade contemporânea.

A interação entre o sistema endocanabinoide presente no corpo humano e os fitocanabinoides da maconha tem relação direta com a regulação do apetite, de dores, inflamações, metabolismo, o sono, o estresse, a memória e muitos outros processos fisiológicos importantes para o funcionamento do organismo.

São aproximadamente 27 condições médicas que podem ser favorecidas pelas diferentes propriedades terapêuticas da planta. Elas estão incluídas nos grupos de doenças crônicas não transmissíveis, condições genéticas, transtornos mentais e doenças infecciosas.

No Brasil, umas das condições médicas mais conhecidas que podem ser tratadas pelo uso medicinal da maconha é a epilepsia refratária. A popularidade veio através da luta de familiares de pacientes com essa doença, que queriam acesso aos medicamentos à base de cannabis e foram os pioneiros na luta pela importação dos produtos.

Essa busca ocasionou avanços na regulamentação da cannabis no Brasil. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), foi o órgão responsável por implementar as regulamentações que transformaram o cenário da cannabis para fins medicinais no Brasil, possibilitando a importação de medicamentos e produtos à base da planta para uso medicinal por parte de pacientes com condições médicas.

A mudança iniciou-se em 2015, com a Resolução da Diretoria Colegiada nº 31, que retirou o canabidiol (CBD), propriedade encontrada na cannabis, do rol de substâncias proibidas e o incluiu na lista C1. Tornando a substância sujeita a controle especial, assim como outras substâncias comuns utilizadas para tratamentos de saúde. Essa conquista veio a partir do caso Anny Fischer, criança com epilepsia refratária que, em 2014, conseguiu, pela primeira vez no Brasil, o direito de importar medicamentos derivados de maconha.

No ano seguinte, a Anvisa publicou as RDC nº 3 e 17, que serviram para estabelecer os critérios para importação de produtos à base de canabidiol em associação com outros canabinoides. Um dos requisitos para a autorização era que fosse realizado um cadastro dos pacientes, em caso de uso próprio, e mediante a prescrição de um profissional de saúde habilitado. O cadastro deve ser feito de forma virtual, apresentando formulário para importação e uso, laudo de profissional de saúde com a descrição do caso, prescrição do produto, e uma declaração de responsabilidade.

Já em 2017, a Anvisa registrou o primeiro medicamento derivado da cannabis no Brasil. Ele é chamado de Mevatyl e é voltado a pessoas com esclerose múltipla. Seu valor ultrapassa 2 mil reais nas farmácias.

Caminhando ao lado dessas regulamentações começaram a surgir Associações para os pacientes que buscam o tratamento à base de cannabis. Hoje elas representam um importante pilar no cenário da maconha medicinal no Brasil.

Em 2019 a proposta era que houvesse um avanço notável na regulamentação desse universo cheio de benefícios e possibilidades. Com o surgimento da RDC nº 327, empresas interessadas em fabricar e comercializar produtos à base de maconha puderam realizar solicitações à agência reguladora. A ideia era garantir maior acessibilidade às famílias que não possuem condições financeiras a terem acesso, de forma mais barata, aos produtos derivados da cannabis. Contudo, das 20 solicitações, somente 4 foram concedidas.

Em 2020, através da RDC 335, a Anvisa estipulou mais detalhes para os pacientes que quisessem importar produtos à base da planta e reduziu a quantidade de informações que devem ser prestadas, facilitando assim os pedidos de importação.

Seguindo os avanços normativos, a mais recente RDC da Anvisa sobre cannabis medicinal, a RDC nº 570/21, surgiu com o intuito de diminuir o tempo necessário para a aprovação e cadastro do paciente, como forma de simplificar o cadastro na Anvisa. Isso ocorreu devido à grande procura de tratamentos à base da planta.

Decisões recentes do STF e da Anvisa sobre o tema da maconha tem demonstrado que cada vez mais estamos nos aproximando de ter amplamente regulamentado o cultivo e o uso da planta para diversos fins em solo nacional.

O PL 399/2015 é um dos principais exemplos disso. Ele busca regulamentar o cultivo da planta para fins medicinais, terapêuticos, industriais e científicos no Brasil, essa proposta, relatada pelo deputado Luciano Ducci (PSB-PR), foi aprovada pela Comissão especial da Câmara dos Deputados em junho de 2021, mas ainda deve passar pelo plenário e pelo Senado. Caso seja validada, representaria uma conquista importante para a pauta canábica e para os pacientes com condições médicas, que continuam a ser prejudicados pela regulamentação atual e a consequente falta de acesso aos produtos derivados da maconha.

Conforme dito acima, a publicação de RDCs por meio da Anvisa significou a regulamentação da cannabis para fins medicinais no Brasil. Contudo, o processo para conseguir esses produtos legalmente não é simples, ainda que tenha sido facilitado ao longo dos anos.

Para importação, o primeiro passo é conseguir uma receita médica, em seguida acessar o portal do Cidadão e apresentar a prescrição, RG e CPF, e comprovante de residência. A partir disso, a Anvisa terá até 30 dias para decidir se autoriza ou não a importação do medicamento. A permissão tem o prazo de duração de 2 anos. Caso o medicamento termine dentro desse prazo, poderá ser realizado nova compra sem que seja necessário repetir o processo de autorização.

É possível comprar também medicamentos à base de cannabis à venda nas farmácias brasileiras. Porém, são poucas as opções disponíveis, além da maioria dos preços serem inacessíveis. Nesse caso, é apenas necessário apresentar a receita médica nos estabelecimentos.

Além das formas citadas acima, é possível a realização do autocultivo da cannabis. Contudo, é um processo complexo para se obter liberação legal, sendo necessário a participação de um advogado, que verificará as condições necessárias e então impetrará um habeas corpus buscando a autorização. Atualmente pouco mais de 450 pessoas têm permissão para cultivar cannabis para uso terapêutico e pessoal no país.

Apesar das dificuldades enfrentadas por quem quer adquirir produtos derivados da cannabis para uso medicinal, o número de pessoas em busca de tratamento vem crescendo vertiginosamente desde 2015.

Em 2015 o número total de solicitações para importação foi de 825, enquanto que em 2020 o número subiu para 15.505 solicitações. Um aumento de 1.780%. Atualmente, mais de 70 mil pacientes são tratados com cannabis, considerando o número de solicitações, importações e renovações concedidas pela Anvisa e também o número de pessoas que são atendidas pelas associações.

A verdade é que a regularização e exploração da cannabis não seria somente benéfico a saúde, ajudando a absorver questões de saúde cada vez mais frequentes mundialmente. Seria também muito importante economicamente.

Em seis anos de regulamentação do mercado da cannabis no Brasil, mesmo com suas limitações, é possível notar como o país tem público e espaço para se tornar uma grande potência nessa indústria. Atualmente são 153 empresas atuando no país, além de 439 produtos usados pelos pacientes terapêuticos no Brasil.

Só em 2020, segundo dados da Anvisa, o mercado gerou entre R$21,9 milhões e R$49,9 milhões. Já no ano de 2021, essa estimativa foi alcançada somente no primeiro semestre do ano, o que indica um aumento expressivo de um ano para o outro.

Infelizmente a maior parte desse dinheiro vai para o exterior, devido ao fato de a grande maioria das empresas serem de outros países. O que surpreende de fato, é o potencial de crescimento do mercado brasileiro, estimado em R$9,5 bilhões, 434 vezes maior que o mercado atual.

Portanto, é necessário e imprescindível que a regulamentação avance, estabelecendo limites claros e procedimentos simplificados para que os cidadãos possam se beneficiar com todos as vantagens existente com a utilização da cannabis. Além disso, com o avanço das normas e mais segurança jurídica, as pessoas, empresas e a sociedade como um todo, poderão desfrutar desses bilhões que podem ser injetados na economia do país.

Esperamos que este artigo tenha oferecido uma visão esclarecedora sobre o Direito Canábico. Se você busca orientação específica ou quer entender melhor suas opções legais, nossos advogados estão à disposição. Clique aqui para saber mais sobre nossos serviços e como podemos ajudar no seu caso relacionado ao Direito Canábico.

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